Todos vocês já sabem que no dia a dia nós devemos anticoagular próteses mecânicas, e existe divergência na Diretrizes quanto as biológicas, não é?
Mas vamos a origem da anticoagulação, principalmente, no que diz respeito em relação as próteses mecânicas.
O artigo a seguir faz uma revisão muito interessante desde o início das próteses e anticoagulação.
Pacientes com prótese valvar mecânica requerem anticoagulação com Inibidores da Vitamina K (varfarina), sendo necessário um perfeito equilíbrio; para evitar eventos tromboembólicos; e ao mesmo tempo diminuir ao máximo o risco de sangramento.
Sabemos também a importante interação medicamentosa, ou com alimentos destes medicamentos, assim como seu efeito teratogênico.
Na tabela acima, vemos o longo recorrido da associação prótese-anticoagulação, iniciando-se em 1952 com o Dr. Charles Hufnagel e a colocação de uma prótese na aorta descendente em pacientes com Insuficiência aórtica.
Associação com eventos tromboembólicos já era importante na época?
No seguimento de 15 anos realizado por Starr-Edwards foram observados eventos tromboembólicos em 70% dos pacientes com troca valvar mitral e 35% na troca valvar aórtica após 5 anos de cirurgia.
Conforme foram evoluindo as próteses, desde o modelo bola-gaiola, passando para o modelo monodisco e atualmente duplo disco, com melhor perfil hemodinâmico e menores eventos tromboembólicos, o risco está igualmente presente e; é inerente as próteses; devido ao contato direto do sangue com o material protético provocando alterações promovendo a formação do trombo, e as comorbidades associadas do paciente, exemplo fibrilação atrial.
Aderência do paciente é importante? Lembrando da necessidade do controle laboratorial estrito.
Considerando países em desenvolvimento, menos de 20% dos pacientes são aderentes, ou seja 4 de cada 5 pacientes não são tratados adequadamente.
Os novos anticoagulantes não seriam uma solução??
Bem, o trial RE-ALIGN foi interrompido devido ao aumento de tromboembolismo e sangramento comparado com a varfarina. A concentração sérica de dabigatran para diminuir trombose em estes pacientes é muito maior comparado ao tratamento para FA por exemplo, aumentando o risco de sangramento.
Retornado ao controle laboratorial nos pacientes com varfarina. Como surgiu o controle do INR?
Inicialmente se realizava o controle do TP (tempo protrombina), o qual determina o tempo de coagulação após adição da tromboplastina (Fator III) e de cálcio. Isto ativa o fator VII; agora VIIa que consequentemente ativará o fator X, finalizando a via comum. Logo estamos medindo a via extrínseca e via comum.
Porém devido a divergências na tromboplastina comercializada no mundo que ocasionava importantes alterações, seja tromboembólicas ou de sangramento, em 1983 foi definido o INR, que nada mais é a relação entre o TP do paciente e o TP de plasma normal corrigido por ISI (International Sensitivity Index) de acordo a Tromboplastina utilizada.
O auto-monitoreo pode fazer diferença?
Ele sendo disponível, demonstrou menor número de eventos tromboembólicos e morte conforme revisão da Cochrane. Em 2017 a ESC, recomenda o automonitoreo, com treinamento adequado.
Alvo INR, conforme AHA/ESC.
ESC
1) Prótese Valvar Aórtica: 2.5
*3 Baixo risco trombogênico valvar associado a troca valvar mitral, tricúspide associada, Fibrilação atrial, tromboembolismo prévio, disfunção ventricular (FEVE < 35%), estenose mitral.
* 3 Risco Médio Trombogênico: Duplo Disco não baixo risco trombogênico (Carbomedics, Medtronic Hall, St Jude, On-X).
*3.5 Alto Risco trombogênico: Lillehei-Kaster, Omniscience, Satrr-Edwards, Bjork-Shiley e monodisco/disco basculante não baixo risco trombogênico (Carbomedics, Medtronic Hall, St Jude).
2) Prótese Valvar Mitral: 3
AHA/ACC
Prótese Valvar Aórtica: 2.5
*3 AHA/ACC Fibrilação atrial, tromboembolismo prévio, disfunção ventricular, hipercoagubilidade.
* 1,5-2 On X-Model
PROACT trial (Prospective Randomized On-X Anticoagulation Clinical Trial) sugere segurança com INR 1.5-2 neste tipo de prótese.
Prótese Valvar Mitral: 3
Há espaço para uso associado dos antiplaquetários?
ESC
-Associar Aspirina nos pacientes com doença aterosclerótica, ou evento tromboembólico a despeito do INR no alvo.
-Angioplastia eletiva, dupla antiagregação por 01 mês se possível.
-Síndrome coronariana aguda, cirurgia aumentar: 1-6 meses, sendo preferencial uso isolado de clopidogrel no alto risco de sangramento.
-Suspender dupla antiagregação após 12 meses.
Portanto é necessária a realização de novos estudos multicêntricos randomizados, sobre o alvo terapêutico de anticoagulação nestes pacientes, atualmente baseadas em sua maioria por opinião de especialistas.
Vejam então a importância nas decisões clínicas. O problema não termina na escolha da prótese. Está só começando. Anticoagulação é um assunto de extrema relevância…
Dr. Horacio Eduardo Veronesi
- Formado em Medicina pela Universidad Nacional de Rosario (Arg)
- Residência em Cardiologia pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (SP)
- Residência em Ecocardiografia pelo Instituto Nacional de Cardiologia (RJ)