Vamos revisar DPOC e HAS?

Hoje vamos discorrer sobre um artigo muito interessante que saiu “do forno” em janeiro de 2020 na respeitada revista NEJM.

Assunto: DPOC e HAS.

Provavelmente todos já atenderam um paciente com diagnóstico prévio de doença pulmonar obstrutiva crônica que chega para o cardiologista encaminhado com diagnóstico recente de hipertensão arterial sistêmica. O que fazer?

Vamos ver esta excelente revisão!

Duas patologias complexas, frequentes e letais, que acometem milhares de pessoas.

Dpoc = doença que acomete 174 milhões de pessoas no mundo com alta restrição as atividades diárias.

Hipertensão arterial sistêmica = doença que acomete mais de 1 bilhão de pessoas e apresenta relação direta com risco cardio e cerebrovascular.

Considerando a característica inflamatória da doença pulmonar obstrutiva crônica com ativação de interleucinas e do próprio sistema renina angiotensina aldosterona, temos aqui um mecanismo de retroalimentação e sinergismo “letal” entre essas duas doenças, sem considerar as comorbidades como obesidade, diabetes mellitus, dislipidemia e sedentarismo que são frequentes.

O estresse oxidativo com intensa disfunção endotelial está muito presente nesse contexto.

Resultado final:

Vamos inicialmente as definições mais atuais, começando pela DPOC, doença inflamatória obstrutiva associada a sintomas limitantes e persistentes.

A confirmação exige o exame de espirometria assim como sua graduação de gravidade.

Nesse artigo a definição aceita foi a classificação de hipertensão do ACC 2017.

Perfeito! Agora que sabemos as definições vamos ao que interessa do artigo. Como tratar esses pacientes? Começamos a entender que os dados aqui são escassos.

A revisão começa com os anti-hipertensivos e ainda atual tiazídico.

Excelente medicação já recomendada como primeira escolha para a população geral, assim como para pacientes com DPOC. Isso veio de um interessante trabalho observacional publicado em 2013.

Vejam só a conclusão:

Redução da incidência de futuras hospitalizações por IC.

Porém devemos lembrar dos efeitos adversos da associação de uma medicação de espolia potássio associado a medicações já usadas para DPOC que fazem o mesmo.

Esse benefício dos diuréticos tiazídicos, além de não ser observado com os diuréticos de alça (que não são medicações anti-hipertensivas eficazes), foi observado mais efeitos colaterais (hipocalemia, alcalose e hiperpnéia) e pior prognóstico.

Vimos que nesses pacientes com a associação DPOC + HAS, temos o sistema renina angiotensina hiperativado associado a maior presença de receptores AT1 nos vasos. Ou seja, temos uma excelente indicação teórica das medicações IECA e BRA, que é exatamente o que foi observado.

Só que sempre devemos nos lembrar dos efeitos colaterais possíveis. A tosse é o principal (atingindo até 1/3 dos pacientes). E o mais raro, porém relativamente mais grave, o angioedema.

Efeitos relacionados ao IECA devido ao seu mecanismo de ação e aumento de bradicinina. Ótima opção para dar preferência aos BRA’S nesses casos.

Os betabloqueadores, apesar de não serem mais a primeira linha de tratamento nas diretrizes mais atuais, o artigo nos mostra que existe espaço e segurança nesse cenário, desde que bem indicado.

Vejamos quando considerar a sua utilização nas diretrizes atuais e no caso dos pacientes com DPOC:

Sempre dar preferência aos cardiosseletivos. Vejamos quais são:

O artigo reforça um dado muito importante. Apesar de sabermos a segurança dos betabloqueadores cardiosseletivos e da presença de paciente com DPOC com indicação formal dos mesmos, a observação é que esses pacientes são tem essa medicação prescrita em < 30% dos casos. Temos muito a melhorar.

Porém orienta que na prescrição devemos começar com doses baixas e ir aumentando gradualmente e com acompanhamento em curtos períodos de reavaliação.

Do grande tripé do tratamento da hipertensão arterial: diurético + IECA/BRA + ACC, ainda falta descrever os ACC. E olha que nesses pacientes ele também é uma excelente opção.

Com dados observacionais sugerindo até a redução de morte e de insuficiência cardíaca.

O artigo descreve ainda em poucas linhas outras classes com os antagonistas da aldosterona.

Os alfabloqueadores e vasodilatadores (com relativa segurança em casos refratários) orientam cautela com o uso de agentes centrais como a clonodina devido a possíveis efeitos de hiperresponsividade brônquica.

Vejamos uma tabela bem didática do artigo que resume de forma brilhante todas essas informações:

E qual seria a meta do controle pressórico? Voltamos aqui ao clássico < 130 x 80 mmhg.

Existe a descrição dos autores ainda de sempre pesquisar por possíveis causas de interação medicamentosa entre os tratamentos nos casos de refratariedade do controle pressão.

Como uso de corticoides orais, excesso de corticoides inalatórios (dados hipotéticos), interação medicamentosa com sinergismo e em caso de associação com rinite alérgica em que o uso medicações adrenérgicas nasais é frequente.

Ou seja, temos um tratamento que se assemelha muito a terapia já utilizada para os pacientes hipertensos, porém temos aqui um paciente considerado mais inflamado e de maior risco cardiovascular.

Devendo a terapia médica ser ainda mais otimizada, não se esqueça de utilizar o betabloqueador, se ele apresentar indicação formal, porque o não uso nesses pacientes se associam a piores desfechos.

Dr. Halsted Gomes

  • Médido da UCO e de Unidade pós operatório
  • Especialista em Ecocardiografia Básica, Avançada e Ecocardiografia Transesofágica
  • Especialista em Cardiologia pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia.