Dobutamina Na Estenose Aórtica

CardioAula - Dobutamina Na Estenose Aórtica

Durante muitos anos o uso da Dobutamina em pacientes com estenose aórtica (EAo) D2 era fundamental para, não só avaliar o diagnóstico correto diferenciando entre uma estenose aórtica verdadeira de uma pseudo-estenose aórtica, como para estimar o prognóstico já que àqueles que tinham reserva contrátil com a infusão de doses baixas de dobutamina apresentavam, nas coortes da década de 90 e anos 2000, melhor sobrevida no longo prazo.

Trabalhos recentes vêm demonstrando que o teste com dobutamina e a comprovação de presença de reserva contrátil não tem apresentado impacto prognóstico nesse grupo de pacientes com o tratamento intervencionista atual. Aqui surgem alguns questionamentos:

1 – Atualmente as coortes incluem pacientes que são submetidos a TAVI, procedimento bem menos invasivo e isso poderia influenciar positivamente na sobrevida, mesmo daqueles sem reserva contrátil. No entanto, sub-análises desses estudos nos mostram melhora nos resultados também naqueles submetidos a cirurgia convencional.

2 – Talvez o incremento do “stroke volume” seja limitado diante de uma pós-carga fixa muito severa (originalmente esse exame foi criado para avaliar miocardiopatia isquêmica – sem alta pós-carga) e não atinja valores acima de 20%, levando, por essa razão e não por déficit grave da função sistólica, a ausência de reserva contrátil nos atuais parâmetros utilizados. Assim acabamos classificando alguns pacientes como ausentes, mesmo o miocárdio ainda sendo. Isso poderia explicar porque alguns pacientes considerados sem reserva contrátil apresentam dramática melhora de função sistólica após a redução da pós-carga com o procedimento.

Ainda há aqueles pacientes que apresentariam aumento de 20% no “stroke volume”, mas não conseguiria atingir os níveis exigidos para serem classificados como EAo importante. Apresentam reserva miocárdica, mas o gradiente ainda ficaria abaixo de 40mmHg, mesmo o paciente tendo EAo importante.

Publicações recentes têm sugerido que nesse cenário, deveria ser aplicada a estimativa da AV aórtica em caso de normalização do fluxo transvalvar (que na aórtica é 250mL/seg). Essa ferramenta tem demonstrado melhor efeito diagnóstico dos pacientes portadores de EAo bem como melhor estimativa prognóstica de sobrevida do que a simples análise de reserva contrátil.

Outro aspecto a ser chamado atenção são os pacientes que apresentariam pouca disfunção sistólica. Por exemplo, entre 40-50% de FEVE e já no repouso apresentariam valores de fluxo bem próximos a 250mL/s. A infusão de dobutamina poderia levar a uma condição supra-fisiológica gerando gradientes elevados em AV > 1 cm2. Nesse caso a avaliação já deveria partir para o escore de cálcio de valva aórtica.

Será que a dobutamina vai ser aposentada para essa investigação? Diante do que vem sendo demonstrado, pacientes que se apresentam com FE reduzida, GS med < 40mmHg e AV < 1,0 cm2 podem ser submetidos ao ecostress. Se o resultado for presença de viabilidade e elevação dos gradientes (EAo verdadeira), indica-se a cirurgia. Se for presença de viabilidade e a AV aumentar, com gradiente < 40mmHg, acompanha-se clinicamente (pseudo-estenose). Naqueles com reserva contrátil presente, mas que o gradiente não ultrapassasse 40mmHg mantendo AV baixa, deveríamos calcular a AV estimada e decidir após avaliar nova AV. Na ausência de reserva contrátil, devemos proceder com a avaliação do escore de cálcio da valva aórtica, o mesmo ocorrendo para aqueles com fluxo perto de 250mL/s ou que apresentem contraindicação ao teste com dobutamina. CardioAula - Dobutamina Na Estenose Aórtica

Ou seja, em breve a dobutamina pode sair dos guidelines e o escore de cálcio assumir esse papel.

Literatura recomendada:
1. Sato K, Sankaramangalam K, Kandregula K, et al. Contemporary Outcomes in Low-Gradient Aortic Stenosis Patients Who Underwent Dobutamine Stress Echocardiography. J Am Heart Assoc. 2019 Mar 19;8(6):e011168.
2. Annabi MS, Touboul E, Dahou A, et al. Dobutamine Stress Echocardiography for Management of Low-Flow, Low-Gradient Aortic Stenosis. J Am Coll Cardiol. 2018 Feb 6;71(5):475-485.
3. Annabi MS, Clavel MA, Pibarot P. Dobutamine Stress Echocardiography in Low-Flow, Low-Gradient Aortic Stenosis: Flow Reserve Does Not Matter Anymore. J Am Heart Assoc. 2019 Mar 19;8(6):e012212.

Artigo Original The Valve Club. Para mais informações sobre Valvopatias: www.thevalveclub.com.br

DR. TIAGO BIGNOTO
-Cardiologista Ecocardiografista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia – SP
– Título de especialista pela AMB de Cardiologia e Ecocardiografia
– Membro titular da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Departamento de Imagem
Cardiovascular (DIC) e Sociedade de Cardiologia do estado de São Paulo (SOCESP)
– Doutor em Medicina, Tecnologia em Cardiologia Intervencionista pela Universidade de
São Paulo (USP)
– Professor pleno no programa de Doutorado USP – IDPC em Medicina, Tecnologia e Cardiologia Intervencionista
– Fellowem Ecocardiografia pela Jhons Hopkins Medicine
– Médico assistente do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia na seção de valvopatias
– Médico preceptor da residência em cardiologia do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
– Editor-chefe do TheValveClub
– Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3875279435063769