Diretriz de Perioperatório e a terapia medicamentosa: farmacoproteção

Betabloqueador 

Sabidamente o betabloqueador diminui a frequência cardíaca, aumentando o tempo de diástole, melhor perfusão coronária, gerando diminuição do consumo de oxigênio pelo miocárdio, e aumentando a oferta do mesmo. 
Os primeiros estudos (há 25 anos) mostravam redução da morbimortalidade, porém isto foi questionado no início dos anos 2000 mostrando potencial maleficio principalmente em pacientes de baixo risco devido a BRADICARDIA e HIPOTENSÃO. 

Ao considerarmos uma forte retrospectiva (2005) com mais de 780000 pacientes, o benefício protetor do Betabloqueador, estava presente em pacientes de maior risco cardiovascular (LEE III-IV), e por outro lado potencial maleficio nos pacientes de menor risco (LEE I-II). 

1° benefício do betabloqueador: presente em pacientes de maior risco.  

Logo veio o POISE Trial 2008 Devereaux e cols: Estudo randomizado prospectivo 8351 pacientes: metoprolol vs placebo com início até 2-4hs antes da cirurgia (dose acumulativa de metoprolol de até 400mg nas primeiras 24hs). Pacientes de risco intermediário-alto: > 45 anos e antecedente de DAC ou AVC ou doença arterial obstrutiva periférica ou internação recente por IC, cirurgia vascular ou associação de Fatores de Risco. 

Resultado 

•  Menor incidência de IAM – Mortalidade cardíaca, PORÉM. 
•  Maior incidência de AVC- Mortalidade Global devido a HIPOTENSÃO –BRADICARDIA. 

É de considerar além da utilização do betabloqueador, a importância do controle da FC como demonstrado na metanálise de Beattie e cols. 

2° importância do tempo de início no perioperatório – realizar dose titulada – controle da frequência cardíaca.  

Resumindo: Eficácia VS Segurança. 

• Início mais precoce possível: pelo menos semana antes (Cuidado: IIIB iniciar dentro dos 7 dias prévios a cirurgia). 
• Dose baixa – titulando até atingir FC 55-65bpm e PA >100mmHg. 
o  Se FC < 50 ou PAS < 100mmHg, suspender temporariamente até reestabelecer controle hemodinâmico e cronotrópico.  
o Alvo pré e pós operatório: FC 55-65 para obter benefício. 
•  Não suspender uso crônico (Única recomendação Classe I). 
•  Uso em pacientes com DAC-Isquemia sintomática-prova funcional (Avaliação pré-operatória excelente oportunidade de otimização do tratamento clinico). 

ESTATINAS 

No contexto perioperatório, a utilização das estatinas, se deve aos efeitos além da diminuição dos níveis de colesterol, ou seja, o efeito anti-inflamatório e estabilização da placa aterosclerótica. 
Primeiro estudo randomizado em 2004 por Durazzo e cols, que compararam estatina (no caso atorvastatina 20mg) versus placebo no contexto de cirurgia vascular demonstrou importante redução de eventos cardiovasculares maiores, como dito anteriormente independente dos níveis de colesterol. 

Logo uma importante metanálise veio confirmar a benefício protetor das estatinas no contexto de cirurgia vascular. 

Existe maior segurança em relação ao início da estatina e a cirurgia comparada ao betabloqueador, sendo importante também o início precoce, assim como sua manutenção de pelo menos 30 dias e posteriormente conforme alvo de LDL. 

No caso da cirurgia não vascular, além de estudos retrospectivos, podemos citar o estudo VISION: o uso de estatina REDUZIU MORTALIDADE GERAL, MORTALIDADE CARDIOVASCULAR E ELEVAÇÃO DE MARCADOR (TROPONINA). 

Segurança das estatinas 

 As estatinas são drogas seguras no contexto perioperatório, devendo sempre ser mantidas salvo situações específicas (exemplo: íleo). A elevação de CPK e comum, porém, valores acima de 5 vezes ou ocorrência de rabdomiólise é rara. 

RESUMINDO: UTILIZAR ESTATINAS NO CONTEXTO DE CIRUGIA VASCULAR; INICIAR EM PACIENTES COM DOENÇA CARDIOVASCULAR (MUITAS VEZES A AVALIAÇÃO CIRURGICA É UMA OPORTUNIDADE PARA OTIMIZAR O TRATAMENTO COMO CITADO NO CASO DO BETABLQUEADOR ANTERIORMENTE) E MANTER EM QUEM ESTÁ EM USO. 

Ácido acetilsalicílico  

O maior estudo randomizado que avaliou impacto do AAS foi o POISE-2 (primeiro estudo em início pré-operatório, “agudo”: 2hs antes da cirurgia). 
Não houve diferença significativa: desfecho primário (óbito/iam) ou secundário (óbito-iam-avc); e sim. 
MAIOR INCIDÊNCIA DE SANGRAMENTO: PRINCIPALMENTE SITIO CIRÚRGICO. 

Algumas considerações: 

•  70% sem histórico de doença cardiovascular; 
•  Não foram incluídos pacientes com angioplastia recente (farmacológica/convencional); 
•  Cirurgias ortopédicas, gerais ou ginecológicas na sua maioria; 
•  Uso de AAS como prevenção primaria. 
•  RESULTADO PRÁTICO:  
o Suspender AAS 7 dias antes da cirurgia no contexto de prevenção primária.

O início do AAS segue a premissa do betabloqueador em relação ao tempo cirúrgico (III iniciar antes da cirurgia). 

Revascularização miocárdica 

A indicação da revascularização (seja cirúrgica/angioplastia) deve obedecer aos critérios tradicionais, ou seja, privilegiando o prognóstico a longo prazo, e não como “profilaxia” de reduzir eventos perioperatórios, devido principalmente ao mecanismo fisiopatológico diferentes. 

Caso haja indicação da revascularização prévia a cirurgia não cardíaca devemos considerar: 

•  Estabilidade clínica pós cirúrgica, doença de base 
•  Risco de sangramento => principalmente no contexto de angioplastia. 

No período de endotelização do stent há risco de trombose do mesmo, e ao mesmo tempo risco de hemorragia pela dupla antiagregação plaquetária. 
Logo devemos considerar o tempo entre a cirurgia não cardíaca e angioplastia (sempre no contexto eletivo). 
Nos procedimentos devido a Insuficiência Coronariana Aguda o tempo é de 1 ano! 

Dupla antiagregação 

 De cada cinco pacientes, um paciente irá realizar uma cirurgia nos próximos 2 anos após angioplastia. 
Assim temos neste caso um TEMPO IDEAL no qual devemos manter a dupla antiagregação, (no contexto agudo – lembrar: 01 ano) e um TEMPO MÍNIMO. 

Porém nem sempre isso é possível (exemplo cirurgia oncológica), então como veremos a seguir existem algumas orientações. 
•  Manter AAS e suspender Clopidogrel-Ticagrelor 5 dias antes / Prasugrel 07 dias antes, reiniciando o mesmo o mais PRECOCE POSSÍVEL (evitar +10 dias, principalmente no clopidogrel). 
•  Em pacientes de alto risco. 
o  Alguns procedimentos endovasculares/sitio compressível pode ser mantida a dupla terapia, sempre após avaliação multidisciplinar. 
o  Alto risco de trombose de stent (diabetes, ICO aguda, angioplastia complicada) terapia de ponte com inibidor IIb/IIIa. 
•  Não DEVE SER REALIZADA TERAPIA PONTE “ANTICOAGULANTE COM HEPARINA”, o objetivo aqui é INIBIÇÃO PLAQUETÁRIA. 

Alfa-agonistas e bloqueadores de canais de cálcio 

Alfa –agonistas 
Modulam a resposta de catecolaminas a cirurgia (diminuição), diminuindo a Pressão arterial e a Frequência Cardíaca. 
No POISE-2 (AAS) foi testada a clonidina => clonidina 2hs antes com manutenção por 72hs (patch). 

Não houve diferença clonidina IAM – morte CV.   Houve aumento de PCR revertida assim como bradicardia e hipotensão significativa. 
CONCLUSÃO: Não é indicada a utilização de alfa-agonistas como objetivo de reduzir evento cardiovascular.  
A utilização no contexto periopertório => Hipertensão de difícil controle – Sedativo. 

Bloqueadores de Canais de Cálcio 

Não estão indicados como farmacoproteção para eventos cardiovasculares perioperatórios. 

Na sequência, discutiremos a Profilaxia para Tromboembolismo Venoso no perioperatório. 


Dr. Horacio Eduardo Veronesi

  • Formado em Medicina pela Universidad Nacional de Rosario (Arg)
  • Residência em Cardiologia pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (SP)
  • Residência em Ecocardiografia pelo Instituto Nacional de Cardiologia (RJ).