Déficit de residência médica será de 4 mil vagas em 2008

Sempre concorrido entre os vestibulares, o curso de medicina tem no mínimo 80, 90 candidatos por uma vaga, seja em universidade pública ou particular. Depois da formatura, após seis anos nos bancos e laboratórios da faculdade, é hora da residência médica.

O treinamento regulamentado que capacita o novo médico é mais concorrido que o vestibular em alguns hospitais e especialidades – ultrapassa 100 médicos por vaga.

Com as turmas de novos cursos de medicina abertos a partir de 1998, a projeção feita por pesquisadores da Universidade de São Paulo é que este déficit aumente 200%, passando de 1.500 vagas (2003) para cerca de 4.400 em 2008. Serão 11.548 graduados para 7.135 vagas de R1 (residência 1).

Apesar de 87% das vagas de residência credenciadas no país estar em situação regular, há uma carência geral de vagas e programas de residência médica no Brasil.

“A residência não é pré-requisito. O aluno se torna médico ao final do sexto ano, após o registro do diploma”, afirma a médica Maria do Patrocínio Tenório Nunes, conselheira do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) e representante da Associação Brasileira de Educação Médica.

Número de escolas aumenta a crise
A residência confere especialização e horas de trabalho prático, um quesito desejado pelo profissional e exigido pelo mercado de trabalho, aponta Maria Nunes.

A crise que a residência médica vive hoje não é apenas resultado dos problemas estruturais do sistema de saúde. A formação do médico especialista é financiada quase que totalmente com recursos públicos, independentemente da localização ou área do programa.

Os residentes queixam-se que os hospitais públicos estão sucateados, que trabalham demais e que o valor da bolsa é irrisório.

Do outro lado, a classe médica preocupa-se com o aumento das escolas de medicina (só no Estado de São Paulo são 28 instituições) e a qualidade de ensino e formação desses profissionais.

“Infelizmente, o Cremesp não tem poder de regulamentar a profissão”, lamenta a conselheira. “Hoje a luta é para enxugar o excesso de vagas de medicina e garantir que os cursos tenham melhor avaliação.”

São Paulo poderia treinar 9 mil médicos
A capacidade de residência nos hospitais paulistas é superior a 9,8 mil médicos. Entretanto, apenas 6,6 estão em treinamento.

Na Universidade de São Paulo existem 1,2 mil vagas, mas apenas 907 bolsas.

Paciente sofre; profissionais têm credibilidade em jogo
Ser médico é um desafio. Boa parte reconhece que a especialização traz não só a chance de melhor colocação no mercado, mas a experiência no diagnóstico e tratamento.

Formando em Catanduva, o bauruense Daniel Seiji Kawai, 26 anos, faz residência em cirurgia geral no hospital Santa Marcelina, conveniado ao SUS, na Capital. Para conseguir a vaga prestou quatro residências públicas em São Paulo e Minas Gerais. Agora disputa com centenas de colegas a chance em cirurgia vascular.

“Minha escolha é por afinidade. Vou buscar ainda fazer outra residência em endovascular”, revela o médico. Ele aponta que muitos optam pelas residências que vão “render mais”, como dermatologia ou radiologia, deixando de lado especialidades vitais como cardiologia.

A atitude preocupa as autoridades. Muitos que não conseguem vaga acabam atuando sem especialização e conseguindo emprego em unidades básicas de saúde, em cidades pequenas e distantes, desvirtuando a prevenção, o ponto mais importante do processo.

“A emergência do país é saturada, porque a base é ruim e a tendência é piorar”, adverte a médica Maria do Patrocínio Tenório Nunes. “O povo percebe que não tem solução e infla o hospital universitário.”

Estruturas
No país das desigualdades, outra problemática levantada por médicos, é a disputa pelas vagas em hospitais na região sudeste, que concentra 63,5% dos residentes.

A maioria dos migrantes vêm do Norte e Nordeste, como Luiz Henrique Andrade Araújo, 27, formado na Universidade Federal de Recife. Faz residência em São Paulo e quer voltar para clinicar em Pernambuco. “Eu desceria de qualquer jeito”, diz. “A formação lá é boa, mas a estrutura para lidar com paciente é muito menor. Volto muito mais preparado.”

Ele gastou R$ 4 mil para conseguir uma vaga em urologia, fez oito provas e aguarda resultados.

HAC será centro de referência na área
Entre as unidades de residência médica na região de Bauru, o Hospital Amaral Carvalho, de Jaú, aguarda homologação da certificação de Hospital de Ensino, que o coloca como centro de referência em oncologia, nível máximo na hierarquia técnica da especialidade.

A medida também elevará o número de residências, que hoje atendem 14 médicos com residência 1 em cirurgia clínica completa.

Radiografias
Concorridas
As especialidades mais disputadas pelos jovens médicos são dermatologia, oftalmologia, ortopedia e radiologia

‘Desprezadas’
Na lanterna das escolhas e com menores relações candidato vaga estão cirurgia geral, cardiologia, reumatologia, pneumologia e medicina familiar

Desistências
O treinamento em serviço é custoso para a sociedade e ainda têm médico que desiste no meio do processo, deixando vaga em aberto e comprometendo sistema e carreira

Regimes
57,5% das residências no país são públicas e 42,5% em parceria com instituições privadas. 68,8% das faculdades estão nas capitais e 31,2% no interior

Verbas
A formação do médico especialista é financiada quase que totalmente com recursos públicos, independente da localização ou área do programa

Fontes: BOM DIA/Cremesp/USP